A falta de prioridade ao ônibus nas ruas dos centros urbanos chegou 
ao limite. Tem comprometido não só o ir e vir de quase todos os 2,3 
milhões de passageiros diários do serviço, mas especialmente daqueles 
que dependem do Sistema Estrutural Integrado (SEI), o modelo 
pernambucano de integração que deu fama ao Estado por muito tempo e que 
representa a espinha dorsal do transporte urbano da Região Metropolitana
 do Recife. Como afirmam técnicos do setor, ela está prejudicando os 
resultados do SEI e, consequentemente, sua imagem. Misturados ao mar de 
carros que se vê nas vias, os ônibus não estão conseguindo cumprir suas 
rotas, provocando a perda de centenas de viagens diárias – algo próximo a
 30% da programação -, o que gera custos ao sistema e maltrata a 
população, a cada dia presa por mais tempo nos ônibus, quase sempre 
lotados e quentes. Se para o motorista, bem instalado em seu carro, com 
ar-condicionado, ouvindo música e, às vezes, até assistindo televisão, é
 ruim, imagine para o usuário do transporte público?
Pelo menos nos últimos dez anos, o governo de Pernambuco se preocupou
 em construir o máximo possível de terminais integrados do SEI, 
previstos no papel desde que foi projetado, em 1984. Foram nove unidades
 somente nas duas gestões de Eduardo Campos, numa expansão nunca vista 
antes no Estado. Mas os TIs não são suficientes. O sistema precisa de 
mais, muito mais. Aliás, como defendem técnicos que participaram da sua 
concepção, os TIs são um dos equipamentos do SEI, não o único. O sistema
 de integração pernambucano prevê outras medidas tão importantes quanto 
os terminais, como corredores e faixas exclusivas para os ônibus em, 
pelo menos, seus seis corredores radiais (vias que se dirigem ao 
Centro). Mas até hoje, 30 anos depois, só há algum tipo de preferência 
em apenas dois deles – Avenida Caxangá e PE-15.

Fotos Guga Matos_JC Imagem
 
Ausência de corredores e faixas exclusivas é um fato real no Grande 
Recife. São menos de 10% das ruas com algum tipo de preferência. Dos 560
 quilômetros de vias por onde os coletivos passam, somente em 35 
quilômetros há espaços segregados. E todos perdem com essa malha quase 
vexatória de tão pequena. A indiferença com que os gestores e a 
sociedade insistem em tratar o problema está custando caro. E muito. Em 
cifras, o sistema calcula uma perda anual de R$ 30 bilhões provocada 
pela fuga de demanda. Os números são da Associação Nacional das Empresas
 de Transportes Urbanos (NTU). Em sentimento, a perda é incalculável. Os
 passageiros estão gastando até o dobro do tempo que levavam para ir e 
vir, adotando, sempre que possível, o transporte individual, seja ele um
 carro novo ou velho, uma moto ou cinquentinha. Não é à toa que a 
inauguração dos últimos terminais integrados do SEI têm gerado mais 
confusão e reclamações dos usuários do que gratidão. Os benefícios estão
 sendo superados pelas dificuldades.
“Terminais integrados viraram objetivo, um fim para os gestores. Como
 se o SEI fosse apenas isso. Ele é muito mais. Não se restringe aos TIs.
 Precisa de corredores e faixas seletivas, operação racional, 
gerenciamento forte e informação precisa ao usuário”, defende um 
técnico, em reserva. A população não se interessa mais pelas vantagens 
da ampliação de deslocamento pagando uma única tarifa, nem mesmo pela 
redução do valor da passagem, quando ela acontece. Ao contrário, a cada 
dia se irrita mais com o tempo perdido e a lotação dos terminais de 
integração, outro reflexo da falta de espaço viário para os ônibus nas 
ruas. Os coletivos saem dos TIs, mas não conseguem retornar, gerando um 
ciclo vicioso e, principalmente danoso para o passageiro. “Dar 
prioridade ao ônibus é a medida mais importante de todas, é urgente. Não
 acho que o modelo de terminais integrados seja ultrapassado, mas, sem 
dúvida, depende ainda mais da prioridade viária. Hoje em dia, só temos 
tirado do passageiro. A baldeação (troca de veículo) é negativa, os TIs 
são lotados e o tempo perdido entre os terminais ou entre eles e o 
destino final do usuário é grande. O passageiro, sem dúvida, percebe”, 
confirma César Cavalcanti, diretor da Associação Nacional de Transportes
 (ANTP) no Nordeste e consultor em transporte.
Otávio Cunha, presidente da NTU, lembra que o ganho de velocidade 
comercial dos ônibus chega a 50% quando faixas seletivas são 
implantadas. “O problema é nacional e precisa ser enfrentado. As faixas 
seletivas, no modelo BRS (Bus Rapid Service), que reúne sinalização e 
fiscalização eletrônica, são baratas. Custam R$ 250 mil o quilômetro, 
custo que inclui não só sinalização e fiscalização, mas também a 
revitalização dos abrigos e a informação ao passageiro. As cidades não 
têm desculpas para não implantá-las”, argumenta.
FAIXAS SELETIVAS PARA MINIMIZAR PERDAS
O poder público garante estar atento às perdas que o sistema de 
transporte público da Região Metropolitana do Recife vem tendo por não 
ter prioridade viária. E, como sempre, faz promessas sobre soluções 
para, ao menos, minimizar o impacto do problema – além de apontar o 
benefício da construção dos corredores de BRT Leste-Oeste e Norte-Sul, 
que nos últimos anos viraram, aos olhos dos gestores, a solução para 
todos os problemas do setor. Algumas das promessas são mais razoáveis do
 que outras, sob o aspecto da realização. Entre elas está a implantação 
de seis faixas seletivas para ônibus, começando por um dos corredores 
mais carregados do Recife, a Avenida Mascarenhas de Moraes, na Zona Sul,
 que ganhará, em outubro, 14 quilômetros de faixas preferenciais nos 
dois sentidos.
O modelo de BRS (Bus Rapid Service), adotado no Rio de Janeiro há 
aproximadamente quatro anos e, recentemente, por São Paulo, com ganhos 
reais de velocidade comercial dos coletivos, está nos planos da 
Prefeitura do Recife, mas não para ser implantado agora. Só no ano que 
vem, depois que houver uma definição sobre a racionalização das linhas, 
pré-requisito fundamental do sistema de BRS. Como ação paliativa, na 
tentativa de mitigar os prejuízos operacionais dos coletivos, serão 
implantadas, num primeiro momento, as faixas seletivas, e, numa segunda 
etapa, a fiscalização eletrônica. A racionalização virá no futuro e 
depende da gestão do Grande Recife Consórcio de Transporte, que por sua 
vez está amarrado à licitação do sistema, em andamento.
“Não será possível começarmos com o BRS. Mas vamos garantir a 
prioridade ao transporte público. Faremos a pintura das faixas de 
imediato, enquanto lançamos a licitação para contratar a fiscalização 
eletrônica. Acredito que em novembro iniciamos a concorrência e, em 
janeiro, começamos com as câmeras. Enquanto isso, contaremos com o 
controle dos nossos agentes e a conscientização dos motoristas”, explica
 a presidente da CTTU, Taciana Ferreira. A Avenida Mascarenhas de 
Moraes, o projeto-piloto, terá sete quilômetros de faixas em cada 
sentido, implantadas à direita da via, entre a Rua 10 de Julho (que 
compõe o binário com a Rua Barão de Souza Leão) e a Avenida Sul, onde 
começa o segundo corredor exclusivo de ônibus do Recife, completamente 
degradado – o primeiro é a Avenida Caxangá.
Depois de outubro, a CTTU parte para outros corredores do Recife. 
Serão beneficiadas até o fim do segundo semestre de 2014 as Avenidas 
Recife (que liga a Zona Sul à Zona Oeste), Abdias de Carvalho (Zona 
Oeste ao Centro), Beberibe (Zona Norte), Domingos Ferreira e Conselheiro
 Aguiar (Zona Sul), nessa ordem. Para implantar os 14 quilômetros de 
faixas seletivas na Avenida Mascarenhas de Moraes a CTTU estima gastar 
R$ 600 mil com a sinalização horizontal e vertical das faixas e R$ 220 
mil com a contratação dos equipamentos de fiscalização.