sexta-feira, 16 de agosto de 2019

ASSUNTO É MOBILIDADE

Com a missão de desatar os nós do transporte público


Publicado por Roberta Soares 
Marcelo Bruto está à frente de uma secretaria que coleciona obras paradas e problemas. Fotos: Felipe Ribeiro/JC Imagem

A vida do secretário de Desenvolvimento Urbano de Pernambuco, Marcelo Bruto, não será fácil nos próximos anos. Ele sabe disso. Além de gerir um sistema de transporte bancado quase que exclusivamente pela tarifa – 85% do custo –, conta com pouquíssimos recursos para a área de mobilidade urbana. E tem, como se não bastasse, uma coleção de obras pendentes ainda da época da Copa do Mundo de 2014, que totalizam R$ 166 milhões. Mesmo assim, o secretário se mostra otimista, diz ter como missão concluir os projetos parados e promete inovação na gestão do sistema de transporte.
JC – Para que você assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Urbano, uma pasta que gerencia o sistema de transporte público da Região Metropolitana do Recife, que coleciona problemas e algumas das principais pendências das gestões do PSB? Qual vai ser a cara da gestão Marcelo Bruto?
MARCELO BRUTO – Minhas metas e desafios estão divididos em três grandes blocos. O primeiro tem a ver com o novo perfil da secretaria, que mudou em relação à antiga Secretaria das Cidades. Antes, o foco da pasta era mobilidade e obras. Foi assim nos últimos quatro anos, quando houve a segregação com a área de habitação e o Condepe/Fidem, que deixaram a pasta. Mas agora essas duas áreas foram reincorporadas para olharmos os problemas urbanos de forma mais integrada. Por isso estamos apostando muito no Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado da Região Metropolitana do Recife (PDUI), que encerrou a fase de audiências públicas recentemente. Nos preparamos para, no próximo semestre, realizar os seminários técnicos necessários para o desenvolvimento do plano e apresentá-lo ao conselho que envolve o governador e os prefeitos da RMR. Assim, teremos como indicar as prioridades para o Grande Recife nos próximos dez anos, sob um olhar integrado. O segundo bloco de metas, inclusive de execução a curto prazo, envolve a retomada e conclusão das obras de mobilidade que estão pendentes na Região Metropolitana. Que totalizam R$ 166 milhões, dos quais R$ 65 milhões serão recursos do Estado e o restante da União.
JC – Para a população, esse é o grande desafio da pasta: concluir as obras de mobilidade sonhadas ainda para a Copa do Mundo de 2014. O senhor avalia como um legado maldito?
MARCELO BRUTO – Veja, é um processo que reflete um pouco o que o País viveu nos últimos quatro anos. Todas as obras e projetos foram planejados num cenário de muito otimismo, de abundância de recursos do OGU (Orçamento Geral da União), numa época em que o Estado estava com o ICMS aumentando a cada ano, sem restrições, com empresas sólidas para realizar obras e fazer projetos. Mas nos últimos quatro anos tudo se deteriorou de uma forma impressionante. A crise na construção civil, na área de projetos, e a falta de recursos do Estado não estavam previstos. Então, diante disso, nosso foco é terminar as obras que precisam ser terminadas. Vamos fazer isso. Concluiremos os dois corredores de BRT (Norte-Sul e Leste-Oeste), o Ramal da Copa (em Camaragibe) e o corredor fluvial (Projeto Rios da Gente, que prevê a navegabilidade do Rio Capibaribe). Esse é o foco dos próximos quatro anos.
JC – Há três anos, o JC fez uma entrevista semelhante com o antigo secretário (Francisco Papaléo) e as pendências e promessas eram as mesmas. O que dizer para a população?
MARCELO BRUTO – O Estado não teve operação de crédito nos últimos anos. A União cortou e dificultou muito a conclusão das obras porque o Estado ficou sem condições de fazer a sua parte, as contrapartidas, arcar com reajustes, desapropriações. Depois de muita luta conseguimos na Justiça essa fonte de financiamento, o Finisa (Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento, da Caixa Econômica Federal). Estamos recebendo R$ 110 milhões, dos quais R$ 13,5 milhões serão para a mobilidade urbana (obras e Simop). O Estado conseguiu, como um todo, R$ 700 milhões. Por causa do cenário ruim, todos os contratos tiveram que ser reincididos, saímos quebrando, fazendo minicontratos. Somente este ano já realizamos 17 licitações. A conclusão dos corredores de BRT é uma das principais metas. Retomamos as obras de adequação do Terminal Integrado Igarassu. Publicamos a licitação das obras do Canal da Malária, que permitirá alargar a Avenida Pan Nordestina e, assim, fazer a segregação física do Corredor Norte-Sul, em Olinda. Vamos abrir as propostas ainda este mês. Tivemos que cancelar o contrato com a antiga construtora do Norte-Sul, a Enza/Aterpa. É difícil, complicado, exige prazos. No Corredor Leste-Oeste, a obra que vamos realizar em breve é a eliminação do giro à esquerda na UPA da Caxangá, que atrapalha demais a velocidade dos BRTs. Já estamos com ela pronta para licitar. As estações do BRT em Camaragibe estão com o projeto para ser licitado e, assim como as duas estações do Norte-Sul pendentes (em frente ao Paulista North Way Shopping, em Paulista, e ao Centro de Convenções, em Olinda), ficarão para o ano que vem. Outra obra que também estamos licitando é um trecho do Ramal da Copa, próximo ao V2 (viaduto 2), que precisamos terminar a camada de asfalto e realizar a urbanização ao redor. É o primeiro de três lotes que já tinha projetos prontos. Os outros estamos licitando projeto ainda.
JC – E qual o terceiro eixo das suas metas?
MARCELO BRUTO – O terceiro eixo é melhorar a gestão e a prestação de serviços na área de transporte público. É um conjunto de ações de curto prazo focadas na operação e infraestrutura. Estou falando de terminais, estações de BRT e abrigos. Falamos da ordenação de filas nos terminais integrados, de disponibilizar mais organizadores nessas unidades, de fazer capinação com mais frequência. Já atacamos três dos 26 TIs: Cajueiro Seco, Macaxeira e Barro. Estamos planejando fazer uma licitação para melhorar os abrigos de ônibus, temos que melhorar os corredores, como é o caso da PE-15, eixo do Corredor Norte-Sul. Nesse caso, fizemos uma divisão de tarefas: firmamos um pacto para que o DER assumisse a operação tapa-buraco este ano, enquanto realizamos um estudo sobre a necessidade de intervenções mais profundas. Contratamos um empresa para fazer essa análise. Concluímos a licitação e, em 90 dias, deveremos ter esse diagnóstico. Os problemas do pavimento do Norte-Sul são visíveis. Embora fosse previsto asfalto, ele não durou o tempo que deveria. A vida útil foi bem menor do que poderia ter sido. A secretaria concluiu que havia problemas construtivos e chegou a notificar a antiga construtora (Enza/Aterpa), mas ela não corrigiu. Estamos tomando as providências. Até porque essa questão tem impacto direto nos contratos de concessão, por exemplo, como os corredores de BRT. A ausência de infraestrutura adequada é, inclusive, usada como argumento pelos operadores no momento em que não atendem a algumas exigências dos contratos.
JC – A secretaria está buscando um novo modelo de gestão para os terminais integrados, repassando-a para a iniciativa privada. Esse é o caminho para os TIs de fato? Eles viraram um grande problema?
MARCELO BRUTO – Uma das nossas grandes apostas é a mudança do modelo de gestão dos TIs. Fizemos um chamamento público, um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), que pode ser usado para concessões. Desde o dia 5 de julho temos cinco empresas interessadas em fazer os estudos de possíveis modelos que poderão ser adotados. Elas terão 120 dias para apresentá-los. Durante a fase de estudos o risco é da empresa. Quando a gente escolher o modelo, faremos uma licitação e a empresa vencedora irá ressarcir a que fez o estudo. Nossa primeira impressão, olhando o que vimos em São Paulo, Fortaleza e Salvador, é que o modelo ideal deverá ser uma Parceria Público-Privada (PPP) patrocinada, que une recursos de exploração de receitas pela empresa com aporte do Estado. Esse aporte, no entanto, pode diminuir com o tempo. Salvador conseguiu fazer uma concessão comum, no Terminal da Lapa. No nosso caso, acho que podemos ter esse modelo em um ou outro terminal, mas no geral deverá ser com aporte do Estado. As empresas entram com mais recursos no período da concessão, que poderá ir de 15 a 25 anos, dependendo da modelagem.
Abrir os TIs é uma das nossas metas também. A abertura, inclusive, complementa esse projeto, mas ela tem outros ganhos. O transporte público da Região Metropolitana do Recife caminhou para um projeto de TIs fechados que hoje alcançou 26 unidades e que gera um problema de gestão. O modelo pensado lá atrás previa a realização de pesquisas físicas e periódicas, a cada seis meses, para ajudar o planejamento do sistema e a gestão dos TIs. Mas hoje nós temos a tecnologia para fazer esse trabalho”,
Marcelo Bruto, secretário de Desenvolvimento Urbano

JC – Sua ideia é abrir os terminais integrados, que hoje são fechados, e adotar a integração temporal de vez?
MARCELO BRUTO – Abrir os TIs é uma das nossas metas também. A abertura, inclusive, complementa esse projeto, mas ela tem outros ganhos. O transporte público da Região Metropolitana do Recife caminhou para um projeto de TIs fechados que hoje alcançou 26 unidades e que gera um problema de gestão. O modelo pensado lá atrás previa a realização de pesquisas físicas e periódicas, a cada seis meses, para ajudar o planejamento do sistema e a gestão dos TIs. Mas hoje nós temos a tecnologia para fazer esse trabalho. Para isso eu preciso ampliar a bilhetagem eletrônica através da integração temporal. A concepção de terminais integrados fechados está vencido pelo modelo de bilhetagem eletrônica. Em Salvador, por exemplo, todos os terminais são abertos, com integração temporal. A gente tem a possibilidade de abrir e de fazer empreendimentos associados, inclusive nos TIs integrados com o metrô, que já demonstrou interesse. A gente tem que partir para isso. O propósito é adotar esse modelo nos 26 terminais em operação na RMR. Em São Paulo, por exemplo, que está licitando a gestão, saíram três modelos diferentes: operação urbana consorciada, PPP e concessão comum. Nós temos convicção de que temos que repassar a gestão.
JC – Mas vai virar uma meta agora? Porque a leitura que se faz é de que o Grande Recife Consórcio de Transporte (GRCT) só adota a integração temporal forçado, na marra, e sob muita pressão do metrô?
MARCELO BRUTO – Mas isso mudou. Estamos percebendo que é um ganho para os dois lados. Não só para o metrô, que precisa se sustentar, mas também nos ajuda no combate à evasão, massifica a bilhetagem eletrônica e gera dados sobre o sistema. Temos visto todas as cidades indo nesse caminho porque ajuda a planejar o sistema, reduzir custos, ter entendimento em tempo real da operação, sem depender de pesquisas a cada ano. A gente aprendeu com a integração temporal no TI Recife que é necessário massificar a informação e distribuir cartões VEM, o que já começamos a fazer. Nos próximos três meses estaremos fazendo a distribuição de cartões gratuitamente. Fizemos um acordo com a Urbana-PE (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros da RMR) e ela estará fornecendo sem custo o cartão para aqueles que estão tirando pela primeira vez. Faremos doação de cartões em Santa Luzia, Macaxeira, Jaboatão, Xambá e Tancredo Neves. Em Santa Luzia será doação e abertura simultaneamente. Nos outros haverá distribuição antes da abertura. Em relação à adoção da integração temporal, vamos fazer um projeto piloto em seis terminais integrados nos próximos dois meses: Santa Luzia, Prazeres, CDU (IV Perimetral), Getúlio Vargas (III Perimetral), Cosme e Damião e Abreu e Lima. A ideia é no ano que vem chegar aos grandes TIs, de Pelópidas a Joana Bezerra. Nossa meta é adotar esse modelo nos terminais: aberto, com integração temporal de duas horas. Nosso cuidado é não impactar na receita para evitar um aumento da tarifa.


JC – Mas é preciso combinar com o futuro gestor dos terminais, já que o Estado pretende fazer concessões. E porque, ao abrir, o acesso ao terminal será liberado, inclusive para o comércio informal. Poderemos reviver situações como a ocorrida no TI Pelópidas, quando um passageiro foi morto por uma bala perdida disparada numa confusão entre ambulantes e seguranças…
MARCELO BRUTO – Sim. Junto com isso nós vamos melhorar o serviço no terminal e a própria segurança. Estamos discutindo com a Secretaria de Defesa Social (SDS) e, provavelmente ainda este mês, deveremos fechar algumas formas de melhorar a atuação da polícia. Começaremos pelos terminais mais prioritários e depois ampliaremos para os outros.
JC – O episódio de morte no TI Pelópidas provocou essa ação?
MARCELO BRUTO – Vínhamos conversando sobre essa questão antes mesmo do terrível incidente em Pelópidas. Até porque a desordem e a evasão nos terminais repercutem negativamente na percepção da população sobre o sistema de transporte.
JC – Você comanda um sistema de transporte que não tem espaço na rua. Não chegou a hora de, como secretário, fazer o que ninguém nunca fez: exigir prioridade viária para o ônibus nas cidades? Você terá essa coragem?
MARCELO BRUTO – A gente concorda que o ônibus precisa ter mais prioridade viária e temos feito reuniões sucessivas com as prefeituras para discutir essa necessidade. Mas não tenho o poder de decidir e entendo as preocupações dos municípios. Mesmo assim, temos puxando essa discussão sim. Concordo que devemos atuar de forma mais forte e permanente nessa questão. Ter um fórum permanente. Começamos com Recife e Olinda, já definindo prioridades. Para o Recife, esse ano, vamos avançar na implantação da Faixa Azul da Avenida Agamenon Magalhães e na realização de ajustes na rede semafórica entre o Túnel da Abolição e a Benfica. Esses dois estão mais avançados. Os outros, como o Derby, ainda não há previsão. A prefeitura tem preocupações em relação ao impacto no trânsito.
JC – E a Avenida Cruz Cabugá, que leva 20% do tempo das viagens do Corredor de BRT Norte-Sul? Vamos seguir esperando um acordo com a Marinha do Brasil sobre a Vila Naval?
MARCELO BRUTO – Não. Estamos com a discussão sobre a Cruz Cabugá bem encaminhada. A prefeitura hoje tem um problema pontual num trecho de 200 metros que ela entende ser necessário um alargamento da via. Isso sendo feito, eles fariam a segregação do corredor de BRT. Foi o prometido. A prefeitura desistiu de esperar pela saída da Vila Naval. Nossa previsão é que isso seja feito no segundo semestre de 2020. Estamos licitando o projeto para iniciar a obra.
JC – E o que será do Ramal Agamenon do BRT Norte-Sul quando for implantada uma Faixa Azul na via?
MARCELO BRUTO – Estamos tentando ver se é possível conciliar o BRT com a Faixa Azul. Esse é o ponto que temos discutido com a prefeitura. Eles têm um estudo conceitual – que está evoluindo para um maior detalhamento – que propõe a convivência do BRT na faixa exclusiva à direita. Mais será necessário algumas intervenções físicas. Até porque não adianta ficar nesse impasse: a prioridade é o projeto do BRT, mas ele não sai do papel e, por isso, não é implantada a faixa exclusiva. E numa via que é consenso a necessidade de aumentar a velocidade do transporte coletivo. Mas tudo isso tem que ser no diálogo. Tem que haver um entendimento do Estado com as prefeituras. O próprio Consórcio de Transportes é uma composição do Estado com as prefeituras. Foi criado para isso. Não é só a vontade do Estado que prevalece.
Se olharmos Pernambuco e compararmos com outros Estado veremos que nenhum assumiu a gestão do transporte coletivo metropolitano. Além de nós, a exceção é o Espírito Santo. Todos os outros deixaram o problema para os municípios. A gente pode até achar pouco, mas não tem quem coloque esse recurso”,
Marcelo Bruto, secretário de Desenvolvimento Urbano
JC – Mas veja, quando você tem um prejuízo na operação do sistema provocado pela falta de prioridade dos ônibus na via e que repercute no subsídio que o Estado dá ao sistema, as prefeituras dividem esse custo? A Prefeitura do Recife paga alguma coisa? Até porque a criação do Consórcio tinha, entre outros, o objetivo de dividir a conta do transporte público com os municípios que são atendidos por ele…
MARCELO BRUTO – Não, isso não acontece. É o Estado quem arca com tudo. Hoje, o governo de Pernambuco coloca, por ano, R$ 250 milhões. Esse valor é dividido da seguinte maneira: R$ 40 milhões para cobrir o VEM Estudantil, R$ 16 milhões para as linhas alimentadoras (Sistema de Transporte Complementar), R$ 50 milhões para investimento e custeio das estações e dos TIs, R$ 60 milhões para a gestão do Consórcio e R$ 45 milhões de subsídio dos contratos de concessões. Esses R$ 250 milhões representam 15% do custo do Sistema de Transporte Público de Passageiros da RMRM (STPP). O restante, 85%, é bancado pela tarifa. Estamos falando de um sistema que fatura R$ 1,3 bilhão por ano, dos quais R$ 1,1 bilhão vem da tarifa.
JC – Você não enxerga o Estado ainda de costas ao sistema, sem olhar para ele com a prioridade que o mundo hoje exige? O fato de subsidiar apenas 15% do sistema não é uma prova disso?
MARCELO BRUTO – Não. Se olharmos Pernambuco e compararmos com outros Estado veremos que nenhum assumiu a gestão do transporte coletivo metropolitano. Além de nós, a exceção é o Espírito Santo. Todos os outros deixaram o problema para os municípios. A gente pode até achar pouco, mas não tem quem coloque esse recurso.

JC – Mas a nossa característica geográfica nos força a isso. Seria difícil um sistema de transporte que não fosse metropolitano…
MARCELO BRUTO – É fato, mas é um mérito inegável do Estado, que foi ousado lá atrás, quando criou a EMTU e, depois o Consórcio. É claro que o ideal era que tivéssemos mais que os R$ 250 milhões de subsídio. Agora, o Estado tem feito um esforço grande na saúde, na educação e na segurança. Há outros serviços tão essenciais quanto o transporte público. Hoje, é muito difícil cobrar que o Estado coloque mais recursos fiscais na situação em que ele está e no esforço que tem feito em outras áreas tão essenciais. O Estado aumentou o investimento em saúde, segurança e educação, enquanto a União diminuiu nos últimos anos. O transporte está sempre competindo por recursos com outras áreas tão essenciais. Acho que temos que compreender isso e ir buscar novas fontes extra-tarifárias. Fazer o que já estamos fazendo ao trazer o investimento do setor privado. Outra discussão é a tributação do transporte privado (gasolina, estacionamento e licenciamento). Estamos começando a pensar nisso. Buscar isso. É um debate que não é fácil porque a sociedade reage. Está cansada de novos tributos. É tudo ainda muito embrionário, mas temos visto o potencial para abrir uma discussão.
JC – O BRT virou, hoje, um problema para o governo de Pernambuco? Vemos, nas ruas, que as cidades e o Estado estão perdendo o sistema. O conceito de transporte de qualidade, moderno, confortável, do futuro. Ele corre risco de virar ônibus comum, com o setor empresarial pressionando para mudar os equipamentos, como já se tem notícia?
MARCELO BRUTO – Nós defendemos muito o modelo de BRT. Achamos que é uma grande mudança de paradigma, sob vários aspectos, infraestrutura, embarque em nível, corredor exclusivo. Mesmo ainda incompleto, quando você compara com o convencional, é indiscutível. Ele recebe as críticas que são justas por não ter ficado completo, mas tem o reconhecimento da população de que é um transporte de qualidade superior. Temos que concluí-lo. Não abriremos mão dele. Acho que não há problema em discutir a integração com o transporte convencional, inclusive adotando modelos mistos. Não vamos tratar como um dogma: tem que ser BRT. Enquanto a gente não consegue chegar ao top, acho que podemos oferecer um serviço melhor, inclusive mudando os equipamentos. O que não iremos permitir é a redução da oferta do BRT.
JC – E o restante da licitação das linhas de ônibus? Como está? Já se passaram cinco anos e até hoje ela não foi homologada?
MARCELO BRUTO – Continuamos revendo o processo, apesar do tempo. Chegamos a enviar os contratos para a PGE (Procuradoria Geral do Estado) para que fosse analisada a possibilidade de assinarmos ou não. Agora, há a necessidade de atualizar dados, o que já estamos cuidando, para ver se será possível ou não manter o processo ou fazer um novo. Vamos fazer uma licitação para contratar uma empresa que vai fazer a pesquisa de integração nos 26 terminais, atualizar todos os dados, vendo a demanda de passageiros. Se não conseguirmos assinar os contratos antigos, esses dados servirão para a nova licitação.
JC – E os empresários? Não pressionam pela assinatura dos contratos?
MARCELO BRUTO – Os empresários vivem uma grande angústia. Querem ir para o modelo de concessão porque ele dá segurança para investir na renovação da frota, por exemplo. Mas, por outro lado, há muita insegurança jurídica porque os contratos são antigos e estão desatualizados com a realidade atual.
JC – E sobre o débito que o Estado tem em relação aos contratos de concessão? Estão pagando em dia ou ainda têm dívidas?
MARCELO BRUTO – Nós estamos regularizando a pactuação desse ano e fazendo a relativa ao débito do segundo semestre de 2018. Os débitos de 2016 e 2017 foram quitados. Hoje, devemos R$ 20 milhões. Já foram R$ 90 milhões. E esse ano a gente conseguiu acertar com a Secretaria da Fazenda para que os pagamentos sejam feitos em dia. Quando há atraso são de poucos meses.
JC – Pegando carona no tema, e o débito com o metrô? O Estado ainda deve? Se deve, paga quando?
MARCELO BRUTO – O débito do metrô está judicializado. A CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos) entrou na Justiça contra o Consórcio, no ano passado. O débito em discussão é de R$ 90 milhões, mas precisamos ver se é isso mesmo. Esse ano regularizamos a situação e os pagamentos estão sendo feitos em dia.
JC – E o Simop (Sistema Inteligente de Monitoramento da Informação), quando ele vai virar realidade?
MARCELO BRUTO – Nós tínhamos dois grandes problemas para fazer o Simop entrar em funcionamento. O primeiro era dar regularidade orçamentária, o que conseguimos este ano com a pactuação com a Etra (empresa espanhola que ganhou a licitação para operar o sistema). Pactuamos R$ 5 milhões, via acordo com o Ministério Púbico de Pernambuco (MPPE). O outro desafio era colocar a telemetria para funcionar. Era algo não equacionado porque não estava no contrato com a Etra e o Consórcio não tinha contrato para isso. Alguns estados usam as operadoras de telefonia, mas achamos que era melhor ter a telemetria independente porque ela também é um instrumento de fiscalização do próprio Consórcio. A solução mais rápida que nós achamos foi fazer a adesão numa ata de registro de preços do Ministério da Economia. Estamos assinando esse contrato em breve para implantá-la. Acredito que no segundo semestre faremos a implantação em todo o sistema de transporte, ao custo de R$ 150 mil por ano. Hoje o Simop opera em três operadoras: nos dois corredores do BRT (Mobi-pe e Conorte) e na Globo.
JC – O Recife e Olinda aprovaram leis que determinam a compra de ônibus refrigerados. Como será operacionalizado isso, já que temos leis municipais para um sistema de transporte metropolitano?
MARCELO BRUTO – Estamos estudando uma proposição para que essa exigência chegue aos principais corredores de transporte, mesmo que as linhas tenham percursos metropolitanos. Esse é o grande desafio. Porque temos operações com permissões e operações com concessões. É preciso dar segurança jurídica. Não é fácil, mas temos que achar uma solução. E queremos chegar a ela ainda este mês. As legislações preveem que a partir de outubro teremos que ter 25% da frota refrigerada. E, a partir daí, chegar a 100% da frota no prazo de quatro anos

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