Um conselho sem credibilidade
É difícil discordar da percepção popular, política e técnica de que o governo do Estado não está preocupado em discutir melhorias reais para o Sistema de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife (STPP). E que se reúne quase que exclusivamente apenas para aprovar o aumento das passagens. Não estamos aqui afirmando que as mudanças não acontecem, nem que não haja a intenção de executá-las, mas que o gestor do sistema não gosta de discuti-las no fórum adequado. O adiamento, no início da manhã desta terça-feira (12/2) da reunião do Conselho Superior de Transporte Metropolitano (CSTM), colegiado que tem autoridade para aprovar ou não as principais mudanças do setor, deu um recado claro: ela aconteceria apenas para aprovar o reajuste tarifário. E com certeza, como a expectativa nos bastidores confirmava, seria o percentual de 7,07% defendido pelo próprio governo do Estado.
Ninguém do Estado concedeu entrevista sobre as razões do adiamento. Em nota oficial, é dito: “A Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) informa que, em consideração à decisão judicial que suspende a eficácia de uma eventual deliberação sobre a revisão das tarifas, a reunião extraordinária do Conselho Superior de Transporte Metropolitano (CSTM), marcada para hoje (12), foi suspensa. A nova data será agendada em momento oportuno”. Ou seja, não restam dúvidas de que ela aconteceria apenas para validar um aumento, que não seria o proposto pelos empresários de ônibus, de R$ 16,18%. A reunião foi adiada, mais uma vez, por decisão do juiz Djalma Andrelino, da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, numa decisão cautelar dentro da ação civil pública movida pela Articulação Recife pelo Transporte, que reúne entidades da sociedade civil como a Frente de Luta Pelo Transporte Público (FLTP) e o Centro Popular De Direitos Humanos (CPDH).
O funcionamento equivocado do CSTM é lamentável para o sistema de transporte público. Perdem todos: gestores, operadores e, mais do que qualquer um, passageiros. O colegiado foi criado para ser muito mais do que um validador dos aumentos da tarifa pré-definidos anteriormente pelo governo – quem acompanha o setor sabe como a votação é feita. Não é à toa que há muitos anos passou a ser fechada, sem acesso da imprensa. Antes, os jornalistas acompanhavam todo o processo. Muita gente não sabe, mas o CSTM deveria se reunir a cada dois meses (antes, era mensalmente), o que nunca aconteceu. Por muitos anos, inclusive, era uma única reunião por ano, exatamente a que definiria o reajuste. A reportagem aguarda dados oficiais do governo com a relação de reuniões realizadas e as pautas discutidas nos últimos cinco anos. Em 2018, por exemplo, foram apenas três encontros.
Deveria discutir melhorias, cobrar mudanças e rever erros da operação. Para se ter ideia: a criação de linhas ou a eliminação delas só precisam ser validadas pelo conselho. A obrigatoriedade de refrigeração nos ônibus é outro exemplo. Ou seja, para o bem e para o mal, o sistema de transporte precisa da aprovação do CSTM. E ele se reúne uma ou três vezes no ano? Como pode?
Confira AQUI como deveria funcionar o CSTM
A composição do conselho é outro aspecto questionável, que embasou, ente outras informações, a ação civil pública movida na Justiça por entidades da sociedade civil e que resultou no cancelamento, pela segunda vez, da reunião do CSTM que validaria o aumento das passagens. São 24 conselheiros presididos por quem estiver sentado no comanda da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh), antes chamada Secretária das Cidades. Atualmente quem preside o CSTM é o secretário Marcelo Bruto, responsável pelo cancelamento do encontro. A composição é a seguinte: Governo do Estado (6 representantes), Prefeitura do Recife (1), Prefeitura de Olinda (1), Assembleia Legislativa (1), Câmara de Vereadores do Recife (1), Câmara de Vereadores de Olinda (1), empresários de ônibus (1), Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU (1), Sindicato dos Rodoviários (1), Sindicato do Transporte Complementar do Recife (1), usuários do sistema (4), estudantes (2), pessoas com deficiência (1) e idosos (1). Ou seja, uma composição com mais representatividade do poder público e que historicamente fecha com o governo do Estado.
Confira AQUI a composição atual do CSTM
ENTENDA O PROCESSO
Uma coisa é certa: se a reunião do CSTM acontecer, o aumento sairá. É fato. Para sorte dos passageiros, a expectativa é de que predomine o reajuste de 7,07% defendido pelo governo do Estado, gestor do sistema de transporte. Sendo oficializado, o anel A passará de R$ 3,20 para R$ 3,45; o anel B de R$ 4,40 para R$ 4,70, e o anel G (pouco utilizado) de R$ 2,10 para R$ 2,25. Pela proposta do governo, o anel D seria extinto e as quatro linhas que hoje o utilizam passariam a integrar o anel A. </DC>Nos bastidores é praticamente certo que a proposta dos empresários de ônibus não deverá passar para felicidade dos 1,8 milhão de passageiros que utilizam o sistema diariamente. O setor, representado pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE), defende uma majoração de 16,18% nas tarifas. Caso fosse aprovada, a passagem do anel A subiria para R$ 3,70, do anel B iria para R$ 5,10, o anel D (hoje de R$ 4,35) chegaria a R$ 4 e o anel G passaria para R$ 2,45.
Os movimentos defendem a redução da passagem para R$ 2,90 (redução para R$ 2,70 que, com o IPCA de 2017 e 2018, subiria para R$ 2,88), de acordo com os valores do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA), de 2015 a 2018, e tendo como base o Manual de Operação do sistema, que condiciona o aumento ao imposto. Segundo a articulação, os três últimos aumentos das passagens foram acima do IPCA e faltam documentos que comprovem o desequilíbrio econômico-financeiro do Sistema de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife (STPP/RMR). Outro argumento levantado leva em consideração a Nota Técnica para Recomposição Tarifária de 2019 apresentada pelo Grande Recife, que, segundo a Articulação, não leva em consideração as receitas provenientes de publicidade nos ônibus e comércio dentro dos terminais, além de apresentar argumentos que não justifiquem o aumento, como por exemplo, a redução de passageiros e o aumento da frota. O último ponto apresentado são as eleições para conselheiros da Sociedade Civil do CSTM.
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